quarta-feira, 25 de março de 2015

A Demanda de Dom Epifânio e de Baldomero - Capítulo 2.

CAPÍTULO 2 – A GESTA DA ALFARROBA

Eis-me de novo aqui, Amâncio, Menestrel de sua gosmenta alarvidade El Rei D. Gervásio, o Alarve, e de sua leda herdeira, a Princesa D. Elvira, a do Remoinho Espetado no Cocuruto, narrador das façanhas e dos actos bravos e alguns menos airosos do Cavaleiro que mais dá nas vistas aqui na Corte de sua  alambazidade El Rei D. Gervásio, o Cavaleiro D. Epifânio.
Além de dotado contador de lendas e outras coisas do género, este vosso amigo exerce também as funções de Menestrel para todo o Serviço, cargo existente apenas nos registos contabilísticos deste Reino, e que se reflectem em funções como contar histórias, cantar, tocar vários instrumentos musicais, desentupir as pias da retrete real, que até entopem com relativa frequência, eu sempre disse que não deviam ter sido feitas nos lados do pântano, que é uma chatice quando a maré sobe, e também fazer de Bobo quando o Custódio, o Parvo está aflito dos bicos de papagaio ou das outras doenças que ele tem, visto que é hipocondríaco.
Pois… acho que gostaria de explicar que a função deste vosso amigo é muito importante, quiçá imprescindível, e que, sem ele, este Reino, se calhar, até nem andava para a frente!
Se ao menos tivesse conseguido a assinatura do Director da Universidade no papel da Licenciatura em Engenharia, talvez me tivessem dado ouvidos, e a casa de banho não fosse nos lados do pântano…Mas um Bacharel, aqui… não vale nada…
Ora voltando à gesta que dá o nome a esta crónica, temos de ir até ao lugar dos heróicos acontecimentos que a originaram, a primeira paragem nesta Demanda do Jarro Sagrado.
Precisamente. A taberna do Pepe.

O ambiente escuro e com uma mistela de cheiros fortes atordoava agora os sentidos de Baldomero, o homem com uma poderosa (para a altura…) carroça de dois eixos e dono de um vergonhoso vício do hidromel que, no auge do seu estado pré-auto-lobotómico, na noite anterior, lá deu uma valente ensaboadela sobre as virtudes do néctar do jarro a El Rei D. Gervásio, o Alarve, razão pela qual se encontrava agora debruçado no balcão da taberna do Pepe, o Galego, com o seu companheiro de aventuras e patrão em geral, D. Epifânio e, lá mais ao fundo no balcão, o arqui-inimigo deste, D. Alarico. 
-“É maijum jarro d’hidromel práqui, ó fachafôr!”, atira o já conformado Baldomero para Pepe, o homem de um só braço à frente da taberna local.
Como Pepe estava lá para o fundo a tentar levantar o atordoado D. Choramingas (sempre foram dois cálices de ginjinha…), que passou a noite toda a lamentar-se de não ter sido convidado para a Demanda do Jarro Sagrado, Baldomero foi atendido pela filha deste, a mui formosa Ramira.
Se Baldomero estava já inebriado, agora ficava completamente ofuscado!
Ramira era a dona dos seus sonhos, a inspiração da sua coragem, e o motivo que o fazia tomar banho, pelo menos, uma vez por mês!
Ao pé dela, como é natural, Baldomero tentava sempre comportar-se, o que, por vezes, se poderia tornar algo difícil, dada a quantidade de álcool que habitualmente tinha dentro de si, e com o cheiro de quem andava a correr por todo o lado sempre com a mesma roupa, e com parca quantidade de água e sabão em cima… que isso água de fosso havia muita no corpinho bem desenvolvido de Baldomero…
Ao olhar para a sua musa com uma expressão de repolho fora de prazo, Baldomero só conseguiu balbuciar embevecidamente “Rameira…”, pelo que, obviamente, foi recompensado com um valente tabefe ministrado pela voluptuosa dama, com uma resposta à altura, por assim dizer: “Ramira, não é Rameira!! Eu sou alternadeira! Só me sento ao colo dos clientes, e mais nada!! Bruto!!
Foi nesse preciso momento que entraram pela taberna dentro dois desconhecidos, dizendo-se almocreves mouros, o que desde logo pareceu suspeito a D. Epifânio, porque entraram aos gritinhos , muito agarrados um ao outro e a fazer olhinhos a D. Alarico, e porque para Árabes eram um bocado deslavados.
Foi quando Urdilde quase desfaleceu com a emoção de estar tão perto de D.Alarico, e Fagilde lhe mostrou o púdico tornozelo até aos fundilhos das ceroulas que D. Epifânio percebeu a artimanha combinada por D. Alarico com as gémeas Fagilde e Urdilde, que lhe vinham lixar a vida mais uma vez.
Preparava-se já D. Epifânio para defrontar corajosamente D. Alarico, desembainhando a sua espada, quando passam a correr desesperadas à sua frente as também conhecidas por Gémeas do Terror, a alta velocidade à frente da Canabis, a mula do Baldomero.
Ora acontece que as nossas duas amigas trafulhas arranjaram para se disfarçar de almocreves mouros uns sacos de sarapilheira que tinham servido de invólucro a uns quantos quilos de alfarroba, que era um petisco deveras apreciado pela dócil mula, pelo que, derivado de terem ficado com o fedor agarrado, a bichinha não as queria largar na mira de poder dar uma dentadita ou outra…
Vendo o caso arrumado, Baldomero volta a concentrar-se no jarro à sua frente, e D. Epifânio continua a tentar dar conselhos sentimentais ao inconsolável Custódio, o Parvo, que está na taberna a curtir a depressão de ter levado com os pés de ambas as gémeas – nesta altura a correr animadas à frente da mula Canabis, motivo pelo qual está neste momento este vosso amigo Amâncio, o Menestrel a amandar bolinhas ao ar com um fatinho idiota com guizos e meias douradas de licra, que ainda não existem na Idade Média, mas de certeza que foi algum arranjinho com o Lelo, o cozinheiro!

E depois voltaram todos para o Castelo, que já se estava a tornar tarde para o jantar, e nesse dia era espetada de boi com batatinhas (que ainda não havia na Idade Média, mas o cozinheiro, Lelo, arranjava de uma maneira que só ele sabia), que é uma chatice ter de comer frio, que fica duro.


FIM!

segunda-feira, 16 de março de 2015

A balada de Fraulein P.

 A Fraulein P. tinha idade para ter juízo mas, por causa dos azares da vida, ficou sem o rico emprego correspondente ao seu juízo e teve de se sujeitar ao call center. nada que desanime uma mulher de armas!

Mas há coisas que, afinal, desanimam.

Fraulein P. tinha qualificações, experiência e vontade de trabalhar.

Fraulein P. sabia a língua alemã ao nível nativo, mas não lhe deram a oportunidade no departamento de alemão, apesar de precisarem (oh, se precisam!).

Fraulein P. tinha quilometragem em secretariado e assessoria, mas não lhe deram tarefas de mais responsabilidade.

Fraulein P. pediu insistentemente mais que fazer, mas o que lhe deram foi trabalho no dia em que tinha de tratar das matriculas do filhote e a folga no dia a seguir, e foi o Texas em cuecas para poder ter direito ao que, por lei, tem direito. 

Fraulein P. até achou o big chefe um homem charmoso e muito interessante quando partilhou uma viagem de elevador com o senhor, o que seria um bom augúrio para uma carreira ali dentro, sendo até a Fraulein uma moça solteira e descomprometida. 

Um dia, inevitavelmente, Fraulein P. foi contactada por uma empresa que lhe ofereceu o que ela queria e mais alguma coisa, e isto quer dizer, sim, fins de semana, sair as 17h, ter feriados, natal E ano novo!, trabalhar mais perto de casa, receber mais ordenado e mais responsabilidade, aceitou, e depois acharam muito estranho ela despedir-se.



Não sejam espertos, não!


2.11


quarta-feira, 11 de março de 2015

Experiência em call center.

Vivi em Madrid entre 2011 e 2013, país igualmente em crise, como o nosso, com a diferença de que, na cabeça do espanhol comum, se é para comprar alguma coisa, compram espanhola, que o que é espanhol é que é bom, ao contrário de cá, em que o que é português é mau e o que é alemão é que é bom.

Em termos de emprego, não é muito fácil, a não ser que se tenha uma profissão muito específica, como informático, área em que não havia muitos profissionais qualificados, já que os espanhóis eram, vá, um bocado nabos.

Com formação em educação e línguas, só tinha duas hipóteses: escolas de idiomas, a dar aulas em empresas (português, que estava na moda, e inglês, porque o espanhol comum, vá, é um nabo, as coisas são todas dobradas e falam um inglês tão típico deles que até há uma rádio nesse inglês e que só eles é que percebem, além de terem a forte convicção de que a maneira deles é que está certa e de que os ingleses têm mas é de ir aprender com os espanhóis!) no cu de Judas, tipo 2 horas de viagem para ir, 1 hora de aula, mais 2 horas de viagem para voltar, e isto quando não era chegar lá e "ah e tal, tivemos uma formação, esquecemo-nos de avisar", ou call centers, muito em voga na altura.

O primeiro onde trabalhei era uma empresa de descontos online e, depois de uns quantos meses a correr Madrid, o que eu considero uma boa formação, porque tive que me desenrascar com a língua, com transportes e com mapas (eu sou verdadeiramente desorientada, acreditem!), tive a sorte de ir para um trabalho em que havia estabilidade de horário, de rotina e de ordenado, e um grupo de colegas, que iam ser sempre os mesmos. 

O trabalho fazia-se bem, basicamente era esclarecer dúvidas dos clientes e ajudar em procedimentos, lá de vez em quando levando com uma reclamação porque a pessoa se esquecia de gastar os créditos mas achava que era nossa a responsabilidade de a avisar, ou uns quantos produtos que nunca mais chegavam e que tínhamos de inventar desculpas para o atraso, quando na realidade o que se passava era que a moça do departamento de parceiros estava tão entretida a abrir mais o decote ao chefe que estava no cubículo mais próximo, que se esquecia de enviar os dados dos clientes. 

O escritório era excelente, um edifício moderno no centro de Madrid, com as coisas todas ali ao pé, até o Pablo Alborán, tinha uma copa toda sim senhor, uma máquina de café de borla, o que foi um mau negócio para os senhores, havendo café grátis e uma dúzia de portugueses na empresa, a equipa era excelente, a nossa coordenadora admirável, ainda hoje a tomo como referência, e devo dizer que não encontrei um chefe de equipa que lhe chegue aos tornozelos, os colegas eram uns grandes malucos e ainda mantemos contacto, uns em Espanha, outros em Portugal, só foi pena vir de lá uma espanhola armada em boazinha, "ah e tal vamos melhorar procedimentos", nós já a imaginar colchões viscoelásticos a ser entregues a tempo e horas mas, afinal, era encerrar ali o departamento de Portugal, abrir um escritório em Lisboa e correr com toda a gente fora com uma carta a dizer que tínhamos baixado o rendimento. O que era uma grande aldrabice.

Assistência em viagem 1, Madrid, estive lá 3 ou 4 meses, avisei que ia casar, despediram-me uma semana antes com a desculpa de que baixei o rendimento e que já não lhes agradava o meu trabalho. 

Como habitual, não faltei um dia, cumpri sempre o meu horário e as minhas funções e nem sequer levantei a voz a colegas ou clientes, gramei com fins de semana no pico do verão num 22° andar sem ar condicionado (e então se Madrid é quente no Verão!), com outros colegas, a ouvir os patrones, de sua graça Montes, y sus amigos, a disfrutar do enorme terraço com piscina que tinham num 23° andar, acima de nós, ali no escritório, em plena cidade de Madrid. 

Ah, o tal papel que, por lei, tinha de entregar a avisar que me ia casar? Ignoraram. 

E uma colega colombiana, que falava espanhol e inglês, foi obrigada a fazer o turno das 23h-8h, a contragosto, com 3 filhos pequenos em casa, e foi despedida por não falar português, que era obrigatoriedade do turno, sendo que já sabiam disso quando a escolheram para esse horário. 

Infelizmente para eles, ela conhecia um bom advogado. 

Não havia sitio onde comer, apenas no nosso posto, arejar, só mesmo indo até à janela discretamente, podíamos ir 20 minutos até a porta do edifício apanhar ar ou, no caso de alguns colegas, fumar, mas não podíamos estar os 20 minutos no nosso posto a comer uma sandocha e um iogurte e a ler um livro. 

O wc era um buraco que não tinha janela, não tinha fecho, não tinha sabão e, na maioria das vezes, não tinha papel nem sequer luz. 

Havia uma maquina de snacks e outra de café, invariavelmente com um papel a dizer "no funciona". 

E sabem que nome carinhoso ganharam os patrões entre a escumalha do andar de baixo, por serem assim de fixes? Os Montes de Me...

Empresa de entregas rápidas, Madrid, entrámos para fazer uma campanha de 6 meses, na ideia de que era um horário de 8 horas para descobrirmos, ao assinar o contrato, que era de 5, até ver, o que foi chato para uma colega que tinha recusado um trabalho melhor, com as 8 horas, mas que era para substituir uma licença de maternidade.

É que também nos disseram que havia possibilidade de continuar na empresa. 

Só se esqueceram de avisar que era só no caso de um colega, carinhosamente apelidado de "enchufe", porque tinha conhecimentos lá dentro... 

Como nos outros sítios, o trabalho fazia-se bem, não tinha de vender ou impingir nada às pessoas, o ambiente é que, enfim... 

Quem caia bem e se ria das piadolas da coordenadora número 1, estava na boa, podia fazer pausa de meia hora sem levar nas orelhas, em vez de 15, quem ignorasse os calções a mostrar o rego da coordenadora nº 2 e dissesse que também era groupie do Alejandro Sanz, mesmo ao ponto de ir acampar dois dias antes para a porta do sítio do concerto, também estava safo, mesmo que levantasse a voz a um cliente e o chamasse de surdo ou de lerdo. 

E duas coordenadoras para um grupo de 10, porquê?

Porque aquilo era tão jeitoso que a que estava lá antes e fazia o trabalho normal, mandou-os à m..., e nenhuma destas sozinhas conseguia fazer o trabalho da outra que, uma vez que já não estava lá, era alvo de todas as lendas urbanas possíveis, acho que só faltou dizer que tinha fugido a cavalo num unicórnio. 

Ah, referi que a coordenadora número 1 deste serviço, cujo principal prestador era americano, não falava uma única palavra em inglês... 

O que quer dizer que o departamento de recursos humanos também não devia funcionar lá muito bem...


Assistência em viagem 2, Lisboa, mas empresa espanhola. Enfim, é o que se vê, não varia muito, lá fui dispensada um mês antes de terminar a licença de maternidade, depois de ter andado meses na formação médica da casa, de ter de andar a sair às 23h, apesar de não ser obrigada, estando grávida (informem-se!), e depois de ter ganho prémio de produtividade antes de sair. 

Acho que a diferença é que dos outros locais trago sempre amigos, mas os lisboetas são um bocado mais susceptíveis com estas coisas de blogs...




Moral da história: estou um bocado relutante em voltar a trabalhar com empresas espanholas...


2.10

sábado, 7 de março de 2015

O dom da comunicação mútua.

Situação 1:

marta, a operadora: Então, temos um smart branco e dourado virado na valeta, matrícula....., em (cidade), mesmo em frente à junta de freguesia, na esquina do café Maminha.

Reboque Faísca da Meia Noite: Qual é a rua? Sem essa informação não consigo lá chegar!


Situação 2:

marta, a operadora: Então, temos um smart preto e azul virado na valeta, matrícula....., em (cidade), Rua das Papoilas Saltitantes, em frente ao número 13.

Reboque Faísca da Meia Noite: Ó menina, e a referência? Sem essa informação não consigo lá chegar!


Situação 3:

marta, a operadora: Então, temos um smart branco e azul virado ao contrário, matrícula....., no Porto, na vci, sentido Porto-Arrábida.

Reboque Faísca da Meia Noite: Ó menina, e em que sentido?...


(A sério, os smarts rebolam. Não tenham cuidado com essas velocidades, e essas malucas das valetas, não!)


2.9

sexta-feira, 6 de março de 2015

O que se traduz, em termos práticos, por "Momentos de pausa" no trabalho.


O nosso horário de trabalho é de 8 horas, mais uma para a refeição e, inicialmente, vinha com direito a 20 minutos de pausa de manhã e outros 20 à tarde, facultativos e não acumuláveis.

Em termos práticos, se não fazem os vossos 20 minutos de pausa, ficam a arder com eles.

Os 20 minutos de manhã e de tarde, eventualmente, um belo dia, e sem que ninguém (da massa trabalhadora daquele departamento, pelo menos) soubesse, foram reduzidos para 10 minutos a disfrutar em qualquer momento da nossa preferência, no dia todo, tendo em conta que estamos as ditas 8 horas a olhar para um pc (só neste ano e meio que ali andei, aumentei uma dioptria e meia, imaginem a qualidade daquele sistema informático!) e com chamadas non stop.

Há que referir que a hora de almoço supostamente calha algures pelo meio, dependendo da nossa preferência ou se houve consenso entre a organização da mesma, a cargo da responsabilidade e da falta dela de quem não a tem entre os colegas da assistência, em vez de ser organizada pela supervisão, ou por um coordenador responsável, para não se dar hipótese de haver desunião e discussões na equipa, apesar de ser também um espectáculo divertido.

Depende dos gostos, claro!

Num outro call center onde trabalhei, enfim, também éramos menos, a nossa coordenadora de grupo era um bocado general, uma líder de tropas organizadíssima e muito justa: chegava lá, apresentava as coisas, explicava porquê, nós percebíamos a lógica, concordávamos, e havia harmonia na família.

Fez dois turnos: os que iam almoçar às 13h e os que iam almoças às 14h. A partir daí, quem almoçava mais cedo, fazia pausa mais cedo, e quem almoçava mais tarde, fazia pausa mais tarde. Esta semana estava metade da equipa com o turno das 13h, e na semana seguinte trocava-se.

Simples e lógico.

(Também deu nas orelhas a uma colega que chegava antes da hora e começava a responder a mails nas costas dos colegas para depois ter mais pontuação, porque era injusto para com os colegas. Uma coisa é andar a laurear a pevide no horário de trabalho e ter menos rendimento, outra é aumentar a estatística nas costas dos outros "competidores". Mas foi um valente raspanete!)

Aqui, é mais no género "Vou às 13h porque já combinei com não sei quem, não me interessa que o outro colega tenha chegado às 8h e ainda nem tenha feito pausa", ou "vou jantar às 20h porque estou farto de estar aqui e vai jogar o Torreense, quero lá saber que o outro colega de turno tenha de ir jantar às 21h para depois sair às 23h".

E sem ninguém controlar, a não ser o próprio discernimento. Estão a ver a coisa?

Chegou-se a apresentar esta experiência à nossa superior directa, mas não foi aceite, optaram antes por confiar na orientação (e na falta dele...) da equipa para se organizar com as horas de almoço e de jantar...

O mesmo se passou com o pedido de verificar a legalidade dos 10 minutos para 8 horas de trabalho com o nosso departamento de Recursos Humanos (sei lá, eles devem perceber destas coisas, não?...), que foram respondidos com um abanar de cabeça e um "não é possível, mas tu podes, que estas grávida".

Pois, podia, mas não era desculpa, estamos todos ali as 8 horas a olhar para a aventesma do ecrã, mas passei a trazer fruta e biscoitos para o meu posto, outra ilegalidade, mas o facto é que ir até ao outro andar e passar pelo novo sistema em que temos de meter o dedo no leitor para abrir as portas e aquilo nem sempre funciona, e ainda voltar, só dá para comer um iogurte, e à pressa, pelo que a grávida quer la saber de ilegalidades, se a criança pede comida a cada duas horas, a grávida enfarda dois pêssegos ou meia dúzia de bolachas Maria a cada duas horas no posto de trabalho e a mandar um reboque para a estrada!


2.8

segunda-feira, 2 de março de 2015

Odisseia do Tacho 2006 - Capítulo 4.

CAPÍTULO 4 – À MEIA-NOITE, O SINO DA IGREJA TOCA SEMPRE DUAS VEZES

O calor abrasador prendia as pessoas dentro de casa – com as suas ventoinhas ligadas ou, em certos casos, os seus potentes e eficazes ar condicionados, a vegetar em frente à televisão com um copo contendo mais gelo que Tang, em estado comatoso dentro das suas banheiras cheias até acima com água fria. 
Ao fim do dia, na Sociedade Recreativa, jogava-se ao strip poker e comia-se salada de polvo, que era fresca e escorregava bem com a imperial geladinha.
Meia-noite em ponto, e o sino toca.
“Que curioso!”, comenta a D. Adélia, já só de combinação, “Nunca tinha reparado que, à meia-noite, o sino da Igreja toca sempre duas vezes!”
Repentinamente, esbugalha os olhos de forma absurdamente anormal, solta um esgar de sufoco e PUMBA! Cai para o lado, novamente de perna aberta! Assim, sem mais!
Os outros jogadores, estupefactos e estáticos com as cartas na mão – o espanhol a tirar discretamente um ás de espadas do bolso das calças – nem sabem como reagir. Maria Odete, surgindo na porta da cozinha a cada 10 minutos para espreitar as novidades, é a única que consegue ter a noção da realidade: “É melhor chamar o cangalheiro.”
O Índio George concorda logo e dirige-se aos pulinhos para a casa de banho, para retocar os seus longos cabelos negros.
Com um telefonema apenas, surge Júlio, o cangalheiro. Também conhecido por ganhar sempre os prémios de rapaz mais giraço do liceu e o de crânio a Matemática, Português, História, Filosofia, Literatura e Geografia. Hoje em dia, divide a profissão de cangalheiro com um part-time como angariador de bailarinas exóticas no estrangeiro. Que é como quem diz no Brasil, onde vai em trabalho/férias 4 a 5 vezes por ano. 
Por vezes, em vez de sair Júlio, sai Xúlio, e foi assim que os Pedaços de Noz conseguiram o seu primeiro grande êxito.
Em menos de 20 minutos, Júlio e as suas bem torneadas e de vestimentas reduzidas assistentes Edneide, Máribéu, Gélzi, Candelária e a ucraniana Natasha preparam um velório à maneira.
Colocam a D. Adélia – mais composta, é claro – no seu caixão rosa bebé, que estava guardado em casa para uma ocasião especial, enfeitam a sala com gardénias e velas de cheiro a framboesa e, cumprindo um dos seus desejos finais, trajam-na com a camisa de dormir modelo Princesa Diana, que a D. Adélia tinha comprado em suaves prestações na loja da Odete Maria, também para uma “ocasião especial, que não era propriamente esta, mas que também servia.”
Pontualmente, chega também o Padre Frederico, ou não tivesse vindo de boleia com o Bruno do talho, na sua lambreta ultra-rápida, apesar de ter sido disputado por António Luís no seu potente mini vermelho de 79. Ganhou o Bruno porque era maior e conseguiu enfiar o António Luís no contentor do lixo, e o Padre teve de se render às evidências. Contra factos não há argumentos, é o que se diz, parece!
Madrugada dentro, estavam já os habitantes da Cadriceira presentes no velório meio adormecidos com o calor e completamente dormentes com o enjoativo aroma que se propagava das velinhas quando a Giséla Sóráia, entretida com o último livro da Margarida Rebelo Pinto, para passar o tempo, exclama: “Foi homicídio!”
Logo um calafrio percorre todo o salão da Sociedade Recreativa – onde se optou por realizar o velório – e os olhares ansiosos cruzam-se por várias vezes.
Odete Maria é rápida. “Foste tu!” – apontando para a sua sósia, a irmã Maria Odete – “Tu e aquele chá de acónito que tens ali na cozinha!”
“Não! Foste tu!” – exclama o Índio George, virando-se para o R.J. – “que eu bem te vi a trocar a garrafa de água por uma outra com aguardente!”
“Isso é impossível!” – diz o Bruno do talho. “A garrafa dela dizia Luso, mas o que tinha lá dentro era a aguardente vínica com 90% de alcóol que o meu tio Maximiano faz. Mas eu vi o Espanhol a dar-lhe um gato! E pensavas que ela era alérgica!”
“Pués eso no és berdad! Lo gatito Rebolho no hace mal alguno, solo caga.” – responde, ofendido, Xavi Fuentes. “Pero la noche pasada, cuando estube en la casa de Odete Maria – com Odete Maria, una grande maluca – la he bisto a enviar una munheca vudu a la víctima! Eso lo he bisto con estes dos olhitos mui guapos!”
“E aquela armadilha para ursos no quintal? Hum?? Quem poderia ser? Caiu lá o meu primo Marco, que agora está no hospital, coitadinho, nem se consegue sentar.” Lamuria-se R.J., o Fanhoso.
“Só pode ser... o Júlio! Era o único que as sabia construir, quando andávamos no liceu... e um funeral traz sempre lucro...”
“Pois, só que eu estava no estrangeiro. Mas houve quem visse o Índio George a pôr um balde com cogumelos à porta da vítima. Cogumelos esses, já o averiguei, da espécie Amanita muscaria – os cogumelos psicoactivos... e mortais!”
A Maria Odete defende-o – a D. Adélia nem tocou nos cogumelos. Mas ela viu a Débora, a transexual, a colocar o piano de 400 kg numa posição instável, e num lugar onde a vítima passava várias vezes, no caminho para o Centro de Saúde.
E viu o Bruno, no outro dia, a acelerar e a fazer pontaria, quando a D. Adélia ia a atravessar fora da passadeira.
E viu também, ela que “vê mais do que os comuns mortais, é claro, o António Luís, uma noite destas, em que ela estava cheia de insónias e foi para a janela arejar, com as luzes apagadas, por causa do calor, é claro, a dirigir-se sorrateiro ao Cemitério e a voltar com um esqueleto, que ela conseguiu saber depois, e isso já não se pode contar, que são assuntos da sua vida particular, que ele meteu o esqueleto no armário dos cobertores para ver se o raio da velha o abria e morria com o susto, mas isso não cabe na cabeça de ninguém, com este tempo ninguém vai ao armário dos cobertores, mais valia ter posto na despensa, onde a D. Adélia guarda os garrafões de água oxigenada, que, se calhar, foi disso que ela morreu, coitadinha, de intoxicação, com aquilo tudo, e não vi mais nada que, entretanto, já estava distraída com outra coisa, mas isso não interessa para aqui, que são assuntos particulares.”
E, enquanto Maria Odete explicava o seu ponto de vista, já voavam velas, coroas, castiçais, cadeiras, travessas de salada de polvo por aquela sala fora, já o R. J. agarrava o Bruno pelos cabelos, enquanto era açoitado pela Débora, que conseguia também dar com a coroa do “Amor de Mãe” no António Luís, que estava a despejar o jarro de sangria pela tromba da Odete Maria abaixo, que tinha trazido a ponta e mola e já estava a querer saltar para furar alguém a sério, não fosse o Índio George a morder-lhe a canela e a meter a mão no traseiro do Júlio.
O Espanhol já se tinha posto a milhas há muito, quando percebera que as coisas iam começar a aquecer. Ao fundo, com a sua batina preta e os seus óculos de sol, um homem de passado obscuro e desconhecido que veio do Brasil, o Padre Frederico está completamente absorvido pelo Super Mário na sua Nintendo DS Lite.
No momento seguinte, o Guarda Arnaldo, a dormir numa cadeira, acorda e levanta-se num repente. O barulho ensurdecedor que ecoava pela sala pára em uníssono enquanto todos olham para o homem que representa a lei, e ouve-se o sussurro do vento no calor da noite.
A um movimento do Guarda Arnaldo, que leva a mão ao bolso, a multidão grita e foge mais depressa que o Titanic do icebergue.
O guarda Arnaldo tira o telemóvel, lê a mensagem semanal do horóscopo TMN, espreguiça-se e vai à vida dele que se faz tarde.
Sozinha no seu próprio velório, com o Padre Frederico a um canto, imerso nas suas cogitações, a D. Adélia acorda estremunhada, larga duas opíparas bufas, exclama:
“Ai que mal me caíram aquelas ameijoas!”, 

sai do caixão e vai para casa.


domingo, 1 de março de 2015

Ah... a nostalgia, essa bicha com dentes...

Mais uma posta vinda lá do outro lado... Recuerdos, recuerdos...


Então, pá, perdeste o pio, foi?

Ná, ainda não foi desta, tenho é andado mesmo atarefada.

E o baby mac armou-se em parvo e resolveu bloquear, pelo que foi passar uns diazitos à assistência...

Ora novidades:

A casa já tem mais móveis no sítio.

Os pombitos estão quase a sair do ninho.

As gatas ainda não os conseguiram afinfar, e é muito pouco provável que alguma vez o consigam fazer.

Já trouxe alguns livros lá de Torres. Enchi 3 quadrados do móvel do Ikea. Ainda tenho imenso espaço. Estou optimista. Pode ser que consiga encaixar a pázada de livros que ainda tenho de trazer E tenha espaço para mais alguns adquiridos nos entretantos.

Mais uma vez, tive muita sorte com os colegas de trabalho. Com os da formação e mais uns arraçados de alemães lá do 6º andar até já houve caracolada.

Obviamente, ganhei nos caracóis, mas não ganhei nas imperiais.

Acho que vou andar de candeias às avessas com uma das colegas mais antigas, porque lhe tirei o caixote do lixo do sítio, sem querer, e ia entrando à vontadex pela casa de banho com ela lá dentro, novamente sem querer.

É cá um feeling, não sei.

Vou abrir no blog a rúbrica de piadolas parvas dedicadas ao tópico "Chamar-se Marta e trabalhar na Assistência em Viagem de uma conhecida Seguradora".

Até agora, ainda não houve piadolas da parte nem de assegurados nem de fornecedores. Apenas do Supervisor. Mas como ele é um fixe, está perdoado.

Por isso, já sabem: se ficarem aflitos na estrada e vos atender uma Marta do outro lado, há grandes probabilidades de ser esta que vos escreve. Muito prováveis no caso de ser aquela #$#"$/ que vos diz que um furo em Ayamonte não está coberto, mas que podemos indicar um reboque para ir ajudar.

Na segunda-feira lá vamos fazer o xixi para uma caixinha e levar uma pica. Uma colega estava interessada em saber se nos vão fazer também testes psicológicos, mas parece que é só físicos, é a minha sorte, daqui a uns dias já percebem o que a casa gasta, mas como também me sei portar muito bem, acho que me safo.

Já me ofereci para levar bolo, porque vamos ficar todos muito fraquinhos depois de levar a pica para tirar sangue, e não pode ser.

Calhou-me na rifa o horário da tarde/noite, pelo que também calculo que vou andar com as teclas do pc marcadas na testa por mor de adormecer em cima do teclado. Espero não me babar muito.

O sítio é muito jeitoso, vou apanhar as marchas em toda a sua glória, coisa que nunca me apeteceu muito fazer, por acaso, mas estou a meio caminho entre a vida maluca da Baixa e a Feira do Livro. Decisions, decisions...

Vou andar por casa sozinha na próxima semana, e já estou a planear grandes feitos nas costas do Puto, desgraçadinho, que vai para Madrid ajudar os borregos que não sabem fazer nada sem ele: vou meter os quadros que trouxe de Torres (isso mesmo, furar paredes...), meter a leitura em dia, passear na Feira, comer farturas, vamos lá ver se o São Pedro alinha nestes belos planos.

Ontem ainda tive oportunidade de mostrar ao Puto a minha costela de Baldomero com a qual não tinha travado conhecimento: aprendeu que não se devem ter cá em casa atitudes românticas tipo tentar pegar ao colinho a sua gaja que está ferrada no sofá para a levar para a caminha sob pena desta acordar com a personalidade mais cavernícola no display. Tenho andado a manhã toda envergonhadíssima, a pedir desculpas, e devo andar de bolinha baixa nas próximas semanas...


2.7

Odisseia do Tacho 2006 - CAPÍTULO 8 – “NÃO VÁS AO MAR, TÓINO...”

Hoje, mais uma vez, é dia de arraial na Cadriceira! Todos os últimos fins-de-semana de Setembro, mais coisa menos coisa, dependendo de como ...