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Mensagens

A mostrar mensagens de março, 2019

A Devoradora de Corações - 3.

Arroz dos Anjos Soror Maria dos Anjos, antes Inês de Negrões, era tida no convento como louca, apesar dos seus inocentes 17 anos, e do facto de ser a única filha de pais abastados e de posição, que aí a depositaram com um dote elevadíssimo ao não conseguir vislumbrar um casamento proveitoso no seu futuro, prevendo, pelo contrário, que o seu bom nome junto das pessoas importantes ficasse irremediavelmente manchado, à conta dos evidentes sintomas que a filha exibia de uma qualquer enfermidade desconhecida ou, talvez, de uma negra possessão. Pois para os seus pais extremosos, muitos tinham sido os anos de sofrimento causados pelas suas alucinações, as suas longas conversas com anjos ou santos ou todos juntos e ao mesmo tempo, até na mesa do jantar com as visitas importantíssimas para os negócios do papá, os jejuns obstinados e prolongados, nomeadamente nos mesmos jantares. Grande tinha sido a sua angústia com a ignóbil ligação que a filha mantinha com gente de condiçã

A Devoradora de Corações - 2.

Arroz Doce Leonor, agora Piedade, nasceu numa família grande e de baixa condição, na cidade do Porto. O bairro onde vira pela primeira vez a luz do dia era escuro e húmido. Leonor não era bonita nem faladora, nem gostava muito de coser baínhas e rasgões. Leonor não ia arranjar marido, mesmo que ajudasse a cuidar dos irmãos mais novos com zelo, competência e amor, e que lhes cozinhasse as papas melhor do que qualquer outra pessoa que conhecessem. Disto tudo já Leonor sabia quando, no dia do seu 8º aniversário, num sombrio 31 de Outubro, a levaram do casebre imundo dos seus pais para a asseada e luxuosa vivenda dos senhores Bastos de Noronha, num bairro elegante e movimentado do Porto. Leonor quase não falava, porque tal não lhe era necessário, pouco mais do que os essenciais “sim, minha senhora”, ou “com certeza, minha senhora”, a energia era-lhe toda necessária para a perfeita execução do seu único e mais completo dever de obediência e, por isso, não a gastav