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Infinito.

Uma, duas, três, quatro, cinco…

Contava oito pedras do lugar onde estava, em círculo, rodeadas por um denso manto de árvores, e mais duas pedras no centro.

Como um vulto e um altar.

Estavam marcadas com símbolos. Espirais e sóis e figuras humanas e animais velozes.

Tão fundo na floresta que não se conseguia vislumbrar um trilho para sair dali.

Ouvia o marulhar do vento nas árvores, o borbulhar de água não muito distante, e o silêncio.

Estariam sozinhos no mundo?

Não se conseguia mexer, não conseguia falar, pelos deuses, mal se lembrava sequer do que acontecera na noite passada e de como chegara ali.

Que lugar era aquele?

Olhou os seus braços, sentindo-os rígidos, e as pernas estavam a deixar de obedecer às suas ordens.

Tentou gritar e nenhum som saía da sua garganta.

Porque não, se ainda ontem ria e cantava e tinha a voz mais solta do que o costume, ao beber aquela bebida quente e doce que estava a ser passada por todos em redor da fogueira?

As labaredas subiram e chegaram aos céus, as vozes cantaram e calaram-se, o ritmo do tambor tornou-se mais intenso e mais rápido. Ou seria o bater do seu coração?

O que é que fizera depois? Dançara. De forma louca, mas centrada, como se o seu corpo soubesse os movimentos da dança sem que tivesse de lho dizer.

O ritmo entrara-lhe nos ouvidos, na voz, no sangue, na alma.

E o que é que dissera?

As palavras vinham-lhe agora à memória, 

queira ser pedra 

queira ser tempo

queira ser eternidade,

as palavras soltas no vento

Tentou gritar, mas a voz não saiu.

Tentou soltar-se, mas o seu corpo não reagiu.

Agora, não passava de uma pedra erguida entre as outras do círculo.




Desafio Semana 14/2024

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